Recentemente, Jonathan Frakes (intérprete de William Riker) contou em um vídeo no twitter como foi o processo de sua entrada para o elenco de A Nova Geração no final dos anos 1980. Frakes participou de diversas audições, sendo as últimas delas dentro do escritório do Grande Pássaro da Galáxia em pessoa, o criador de tudo, Gene Roddenberry.
Durante uma dessas entrevistas Gene fez questão de revelar para Frakes do que se tratava Star Trek. Ele que queria que o jovem ator - prestes a entrar para aquele universo utópico - compreendesse claramente o que ele representava: um mundo sem machismo, sem racismo, sem fome, sem ganância e onde todas as crianças sabiam ler.
Os fãs de Star Trek estão cansados de saber que o mundo visto na série é exatamente assim (ou quase sempre assim). Mas vejamos isso um pouco melhor, vejamos como liberdade e igualdade se interconectam na visão de Roddenberry.
Um mundo sem machismo é um mundo onde as mulheres não estão mais aprisionadas pelo simples fato de serem mulheres. Libertam-se das correntes do patriarcado, tornando-se assim iguais aos homens. Um mundo sem racismo é um mundo onde os negros – ou qualquer não branco – não são escravizados, massacrados e marginalizados durante séculos pelo fato de possuírem a cor da pele diferente.
Já um mundo sem fome se trata de um mundo onde todos têm acesso à alimentação digna de um ser humano, não estando mais sujeitos a única liberdade concedida aos famintos que é morrer de inanição.
Um mundo sem ganância é o mundo onde as pessoas não são tornadas escravas pelo dinheiro, onde agem de maneira antiética em busca de acumular riqueza. É o mundo onde o ser humano controla as coisas e não mais é controlado por elas.
Por fim, um mundo onde todas as crianças saibam ler é um mundo onde o conhecimento está ao alcance de todos, onde existe, de fato, a liberdade de aprender, de ensinar e de crescer.
Todas essas liberdades preconizadas por Gene Roddenberry, expressas nos quase mil episódios de Star Trek ao longo de mais de 50 anos, estão profundamente ligadas à igualdade.
Quando as mulheres e os negros não mais são oprimidos, quando ninguém passa fome, quando o “ser” é mais importante que o “ter”, quando todas as crianças são alfabetizadas, aí verificamos relações sociais igualitárias sobre as quais ergue-se uma humanidade livre.
Por isso, sem igualdade não existe a verdadeira liberdade. O ser humano só pode ser efetivamente livre quando todos têm acesso às mesmas oportunidades. Qualquer coisa fora disso é a velha retórica liberal. Nesta, encontramos a defesa intransigente (porém hipócrita) da liberdade, sem revelar que, na verdade, defende somente a liberdade de propriedade, como não fariam melhor os ferengis através das suas Regras de Aquisição.
Os liberais pregam a liberdade como um valor universal, mas, por trás das aparências, surge unicamente a liberdade das classes proprietárias disporem como bem entenderem de suas propriedades, seja lá que forma elas assumam.
Na escravidão, os proprietários eram totalmente livres para usufruírem da sua propriedade que se tratava de outro ser humano escravizado. E estes proprietários eram todos liberais, como demonstra a Revolução Americana, feita por escravistas. Como demonstra a construção do Império Britânico, sobre o tráfico de escravos e tantos outros exemplos históricos. Não vemos nada disso na Federação Unida de Planetas. A liberdade dos liberais já não mais existe.
No universo de Star Trek, no sistema livre e igualitário da Federação, já não há mais a escravidão nem as outras formas de dominação que atentam contra a liberdade e a igualdade. O ser humano é livre e inserido numa sociedade justa. Marx já alertava: “O reino da liberdade só inicia onde termina a necessidade”. Em suma, todos aqueles que necessitam de reconhecimento ou que, simplesmente, não tenham o que comer, nenhum deles será livre enquanto o velho mundo persistir.
Jonathan Frakes diz que aquela reunião com Gene Roddenberry o tocou forte no fundo do coração. Deveria tocar a nós todos também. Além disso, deveria nos inspirar para a construção da verdadeira liberdade.
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