sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Star Trek Beyond: nos 50 anos, o reencontro da série com os fãs


Eu confesso: durante um bom tempo manifestei, aqui mesmo nesse blog, meu temor em relação a Beyond. Procure nos links aí ao lado e você vai ver. Critiquei a escolha de Justin Lin como diretor; esbravejei contra as declarações de Simon Pegg; quase desisti de tudo quando, no primeiro trailer, lá estava novamente a famigerada música dos Beastie Boys. Tudo justificado, afinal, a decepção com os dois primeiros filmes da Kelvin Timeline (muita em relação a Into Darkness; um pouco menos com o filme de 2009) provocou a descrença em trekkers do mundo todo de que desta vez pudesse ser diferente, que poderíamos sair do cinema rindo à toa e com vontade de ver de novo e de novo. Os temores se revelaram infundados e foi exatamente esta alegria de assistir Star Trek no cinema que voltou a acontecer. Sem Fronteiras é o melhor dos filmes desta nova trilogia. Em todos os aspectos.

Em primeiro lugar, parece ter havido uma tomada de consciência por parte dos produtores de que a franquia trilhava perigosos caminhos. Cada vez mais voltada somente para o público "leigo", oferecendo apenas migalhas para os fãs de uma vida toda. Beyond é quase um pedido de desculpas, ao procurar recriar - sem esquecer o público mais amplo, evidentemente - a atmosfera de TOS. O filme é um episódio de duas horas da série original. Todos os elementos estão lá: os dilemas, a aventura, o desconhecido, o drama e - sobretudo - a comédia. Beyond faz o público rir o tempo todo. Simon Pegg, corroteirista ao lado de Doug Jung, caprichou nas falas cômicas, principalmente nas que envolvem Scotty - interpretado por si próprio - interagindo com a fantástica personagem Jaylah, encarnada magistralmente por Sofia Boutella. Esta personagem acrescenta muito em qualidade ao novo cânone, merecendo participar das próximas aventuras daqui pra frente. Mesmo com a destruição da Enterprise - que é, diga-se de passagem, perfeitamente crível e contextualizada - o filme não irrita os fãs em nenhum momento e é capaz de atrair o grande público, pelos personagens carismáticos, pelas boas doses de ação e pelos grandes efeitos especiais. 

Outro fator que torna Sem Fronteiras o grande filme do reboot está nas interpretações quase sobrenaturais de Chris Pine (James T.), Simon Pegg (Montgomery Scotty) e Karl Urban (McCoy). Na terceira aventura estrelada pelo elenco, estes atores conseguem emular à perfeição os atores que eternizaram os personagens há 50 anos. O sorriso e a fala em staccato de Shatner; o estalar de dedos e o peculiar tipo de humor imprimido por Doohan em Scotty; o tom de voz inconfundível de Kelley. Aliás, eu nunca tive nada contra o elenco, que é talentoso e funciona muito bem junto, como fica definitivamente comprovado em Beyond. O derradeiro filme de Anton Yelchin como Chekov é, precisamente, aquele no qual o personagem apresenta maior destaque. Imaginei que ficaria triste ao vê-lo na tela. Pelo contrário, a presença de Chekov no filme é tão divertida que sentimos alegria por vermos Yelchin eternizado como o jovem Chekov, sendo tutoreado por um capitão Kirk mais experiente.

Outra interação fantástica se dá entre Spock e McCoy que precisam lutar juntos pela sobrevivência. A dupla protagoniza os momentos mais engraçados do filme, com diálogos que remetem às eternas rusgas entre os dois ao longo dos 50 anos de franquia. Além disso, a dupla tem papel fundamental no bom desfecho da trama. 

O vilão Krall, interpretado por Idris Elba, é profundo, pois se trata de um personagem que perdeu sua identidade e daí advém sua revolta contra a Federação. Em suma, o filme trata com bastante competência sobre questões identitárias, já que a vida no espaço (onde tudo se torna episódico, de acordo com Kirk) faz com que os personagens acabem esquecendo por alguns momentos quem são, quais seus propósitos, como seguir em frente. Este enfoque se dá sobretudo em Kirk e Spock. O primeiro, em crise, pela rotina da missão e por se tornar mais velho que seu pai quando morreu; Spock por acreditar que não tem mais papel dentro da Frota, sentindo-se impelido a abandonar tudo e correr para ajudar seu povo em New Vulcan. E nesse ponto o filme homenageia Nimoy de forma sincera e emocionante. A reverência a Nimoy e ao elenco originial é um dos fios condutores de Star Trek Beyond. Assim, Sem Fronteiras se torna um filme a altura das celebrações dos 50 anos de Star Trek. 

Um ponto que sintetiza isto, esta guinada que Beyond dá quando comparado aos filmes dirigidos por JJ Abrams, está na música Sabotage, dos Beastie Boys. Criticada até o infinito pelos trekkers e causadora de revolta quando todos ficaram sabendo que estaria também em Beyond, por fim os realizadores deram uma resposta a altura a este problema, encontrando uma saída satisfatória. Finalmente, a música adquiriu sentido dentro de Star Trek, em uma solução narrativa nada mais, nada menos do que genial. Se a música ilustrava a rebeldia do jovem Kirk, agora ela assume contornos muito mais interessantes, tornando-se uma personagem importante na história. Os trekkers finalmente podem fazer as pazes com Sabotage. 

Um filme para chorar de emoção, um filme para dar gargalhadas. Um filme para celebrar os 50 anos da série que é objeto da paixão de milhões mundo a fora. Beyond é cheio de significados. O mais importante deles talvez seja o de promover o reencontro de Star Trek com os fãs. Após alguns estremecimentos na relação - algo natural em um casamento de 5 décadas - a paz retorna a todos os quadrantes da galáxia. Falaremos de Star Trek: Sem Fronteiras durante muito tempo ainda. 

Vida longa e próspera a Jornada nas Estrelas.

3 comentários:

  1. É engraçado como esse filme foi um divisor de águas dentro da franquia de ST.
    Eu saí do filme ontem com exatamente essa sensação de homenagem e reconciliação com e para os fãs.
    Foi um filme onde o espírito de Star Trek estava presente: não é um filme de um ator principal, mas de uma tripulação. Onde todos são únicos e fazem parte do UNO, que se chama Enterprise.
    Um roteiro bem escrito, feito por um fã, para os fãs e respeitando os fãs...

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